Vitor Vasquez*
Oficializadas as candidaturas e iniciada a propaganda eleitoral gratuita, é possível identificar tendências de oferta e alianças partidárias. A partir disso, mapeei as candidaturas para prefeito no estado da Bahia, buscando indicar alguns padrões de alianças partidárias e interpretar o quanto de coerência essas alianças possuem e se elas se articulam com parcerias firmadas anteriormente no âmbito estadual.
Analisei as ofertas de candidatos e as coligações para prefeito nos 417 municípios baianos. Como os partidos das federações obrigatoriamente atuam em conjunto, sempre que elas estão presentes, as tomei como referência, e não o partido especificamente. Ao todo foram 1.143 candidaturas registradas, sendo somente 268 (23,4%) isoladas, isto é, compostas por um único partido ou federação. Portanto, a predominância é de candidaturas via coligação, o que é esperado em contextos multipartidários como o nosso. Os únicos partidos ou federação que apresentaram postulantes a prefeito em pelo menos 10% dos municípios foram: PSD, que ofertou candidato em 230 (20,1%) cidades; a Federação Brasil da Esperança – FE Brasil (PT, PCdoB e PV), com 191 nomes (16,7%); Avante, com 132 (11,5%); e MDB, com 118 (10,3%). Só então aparecem Progressistas, 84 (7,3%); e União Brasil, 81 (7,1%).
Nestes dados iniciais, é notável a presença de partidos e da federação que compuseram a coligação vencedora da última eleição para governador, encabeçada por Jerônimo Rodrigues (FE Brasil – PT, PCdoB e PV), tendo como vice Geraldo Júnior (MDB) e composta ainda por PSD, Avante e PSB. Destes, somente o PSB não compõe hoje a lista dos que mais oferecem candidatos para prefeito. Entretanto, o partido é parceiro histórico do PT nas eleições gerais e é o sétimo partido com mais candidatos no estado, disputando 53 (4,6%) prefeituras. Em suma, compor o governo estadual é um bom incentivo para investir recursos em candidaturas para prefeito, ao menos nas cidades da Bahia.
Tal dinâmica torna-se ainda mais explícita ao observar as alianças formadas nestas candidaturas. Analisando a quantidade de municípios onde cada dupla de partido ou federação participa da mesma coligação, independentemente de encabeçar a chapa ou não, identifiquei que a dupla PSD-FE Brasil compõe a mesma chapa em 194 (46,5%) municípios. Em seguida vêm as duplas FE Brasil-PSB e FE Brasil-MDB, presentes em 127 (30,5%) e 109 (26,1%) coligações, respectivamente. Portanto, ter proximidade ao governo não só impulsiona candidaturas para prefeito como ajuda a estabelecer padrões nítidos de aliança, indicando uma coordenação no estabelecimento destas candidaturas. E, embora tal coordenação seja mais explícita nas alianças das quais participa a federação do governador, ela se estende aos demais membros da coligação vencedora do governo estadual em 2022. Afinal, as duplas que mais participam das mesmas coligações municipais, além das citadas anteriormente, são PSD-PSB, Avante-PSD, FE Brasil-Avante, e PSD-MDB, que compõem, respectivamente, 105 (25,2%), 104 (24,9%), 98 (23,5%) e 94 (22,5%) coligações.
Contudo, nem tudo são flores nesta dinâmica e devemos verificar também o outro lado da moeda dessa coordenação partidária. Afinal, se estes mesmos atores estão presentes em tantos municípios, é provável que, além de alianças, em diversas ocasiões eles se confrontem. Cada um destes partidos e federação tem seus próprios objetivos e os prêmios em disputa – as prefeituras – são escassos. Então, se em algumas ocasiões eles trabalham em parcerias coordenadas, em outras concorrem à mesma fatia de bolo, e só um pode conquistá-la.
Prova disso é que, se por um lado PSD-FE Brasil estabelecem a dupla que mais participa da mesma coligação no estado, por outro, até por serem os partidos que mais candidatos a prefeito oferecem, conformam também a dupla que em mais municípios se enfrenta: 67, o que representa 29,1% e 35,1% das prefeituras disputadas por PSD e FE Brasil, respectivamente. Três desses confrontos ocorrem em municípios relevantes da Bahia, que possuem mais de 100 mil habitantes: Eunápolis, Ilhéus e Paulo Afonso. A lista dos que mais disputam a mesma prefeitura segue na mesma toada, sendo composta pela dupla PSD-Avante, que se enfrenta em 61 cidades, e PSD-MDB, dupla adversária em 54 pleitos. Isto representa para o PSD, em ambos os casos, cerca de ¼ de suas candidaturas e, para Avante e MDB, quase metade dos municípios onde encabeçarão suas chapas nas disputas para prefeito.
Interessante notar que, ao passo que FE Brasil é quem mais se coliga municipalmente com seus aliados estaduais, indicando um esforço em fortalecer estes elos; o PSD, por mais que também busque sistematicamente esses parceiros, é quem mais concorre com eles, se mostrando como um aliado relevante, mas que possui mais autonomia em busca de seus próprios interesses. Isto ilustra bem a dinâmica de coligações e disputas em contextos multipartidários, pois, os parceiros podem ser, a um só tempo, relevantes colaboradores e poderosos adversários. Coordenar este processo é uma arte difícil, que demanda recursos cujo gasto envolve altos riscos em cenários competitivos.
(Crédito de imagem: O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues cuja coligação vencedora de 2022 é formada por partidos que mais oferecem candidatos a prefeito neste ano (Marcelo Camargo/Agência Brasil - 22/11/2023)
*Vitor Vasquez é doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com período sanduíche na Universidade da Califórnia – San. É professor da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Piauí (PPGCP-UFPI). Líder do Grupo de Estudos em Instituições Políticas InsPol (CNPq-UESC). Este artigo foi publicado originalmente na Revista Nordeste.
Comments