Mais do mesmo nas eleições paranaenses

Mais do mesmo nas eleições paranaenses

Bruno Bolognesi 

 

Desde que foi instituída a possibilidade de reeleição para cargos majoritários executivos em 1997, o estado do Paraná reconduz seus governadores. Levando em conta a primeira eleição de Jaime Lerner em 1994, são 28 anos em que o mandatário volta a ocupar o cargo na posição mais alta do estado. E não há perspectiva de que esse padrão mude. Nas eleições deste ano o atual governador caminha para uma vitória ampla em primeiro turno, tendo 55% das intenções de voto segundo levantamento do Ipec de 16 de setembro e uma estimativa de 69% dos votos válidos segundo a Radar Inteligência da mesma data. Ainda, em todo esse tempo, a oposição concentrou-se em um único nome que segue na disputa, Roberto Requião (PT).

 

No Senado o quadro é de maior rotação de cadeiras, como era de se esperar, mas com algumas constantes. Álvaro Dias (Podemos) ocupa a cadeira de senador pelo estado desde 1998 e os dados da mesma pesquisa IPEC indicam a reeleição do senador com 35% das intenções de voto, contra 25% de Sérgio Moro (União Brasil). Contudo, a bancada paranaense no Senado tem dois novatos em primeiro mandato senatorial, ambos agora no Podemos, mesmo partido de Álvaro e que o lançou candidato à Presidência nas eleições passadas e o sustenta na atual disputa.

 

Na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) a situação não é muito diferente. Além de quinze das 54 cadeiras serem ocupadas por deputados do mesmo partido do governador (PSD), a mesa diretora é formada por um presidente e primeiro vice presentes na Alep desde as eleições de 1990. Os demais membros estão em, pelo menos, seu segundo mandato. Além disso, a oposição não conta com mais de uma dúzia de cadeiras. Com a taxa recorde de deputados disputando reeleição neste ano (média de 87% conforme noticiou a Folha de São Paulo), a probabilidade de novos representantes parece mais distante do que na eleição passada. 

 

Por fim, nas eleições presidenciais, o Paraná é outra constante. Desde o governo Collor, o Paraná vota sempre no candidato que faz oposição ao Partido dos Trabalhadores (PT). Elegeu Fernando Collor, duas vezes Fernando Henrique Cardoso e se dependesse somente dos eleitores paranaenses teria eleito Geraldo Alckmin em 2006, José Serra em 2010 e Aécio Neves em 2014. Os paranaenses também elegeram Bolsonaro em 2018 e o levantamento IPEC aponta para a liderança deste, agora em 2022, com 44% das intenções de voto contra 36% do candidato petista. O único ponto fora da curva foi a eleição de 2002, quando o eleitor do estado votou majoritariamente em Lula.

 

Portanto, para além das disputas regionais, o desempenho dos candidatos presidenciais parece seguir a trajetória já bastante consolidada de partidos e candidatos mais à direita do espectro ideológico largando na frente. Ainda que Lula tenha sido dominante em 2002, é a exceção que confirma a regra. Em todos os outros anos pós-1988 o Paraná votou majoritariamente em candidatos que faziam e fazem oposição ao polo petista. Nesse ano não deve ser diferente, como as pesquisas indicam, e Bolsonaro deve ter um apoio ligeiramente superior ao de Lula no estado.

 

Tudo isso para dizer que o Paraná não parece muito afeito a mudanças e pluralismo quando se trata de nossos representantes. Mas, quais seriam os fatores que levam ao quadro estático na política paranaense e que deve se repetir nas eleições de 2022? 

 

O primeiro, e mais importante, em minha avaliação, é a baixa capacidade de articulação e renovação da oposição, restrita hoje ao PT. A organização que capitaneou a esquerda ao poder e estruturou a competição partidária nacionalmente sempre foi um partido de segunda ordem na terra das araucárias. O PT paranaense teve sua principal força nos pés-vermelhos, expressão regional que denota os nascidos no norte do estado. Londrina, portanto, sempre foi a estrela vermelha nessas paragens e responsável por fornecer quadros nacionais para a falange petista, como os ex-ministros Gilberto de Carvalho, Márcia Lopes, Paulo Bernardo e Gleisi Hoffman (atual presidente do partido). Por outro lado, ainda que a força da principal organização de oposição estivesse localizada na parcela ao norte, a mesma região produziu os dois principais concorrentes ao Senado neste ano: Álvaro Dias, com sua base política em Londrina e no agronegócio, e Sérgio Moro (União Brasil), nascido em Maringá, que tem usado a carta ‘interiorana’ como mote de uma campanha disputada em torno de um pé de café, região produtora partilhada por ambos. Isso não é necessariamente um problema, mas mostra como o petismo não conseguiu se estruturar como um player regional no Paraná, ocupando a prefeitura da capital ou tendo candidato próprio ao governo para além de algumas figuras sem expressão eleitoral. 

 

O segundo fator a explicar as continuidades na política estadual relaciona-se com o fato de que o Paraná sempre teve dificuldades para nacionalizar suas eleições para além da presidencial. Ainda que a disputa ocorra sempre tendo dois polos, um alinhado ao governo federal e outro oposicionista, um único nome foi responsável desde 1990 por fazer a vez de uma oposição não partidária. Roberto Requião, que hoje disputa com poucas chances pelo PT, foi em toda sua carreira filiado ao MDB. Um partido fisiológico que no Paraná ganhou ares de esquerda devido à posição pessoal do ex-governador e ex-senador. E que, após sua saída, voltou a ser mais um partido sem cor programática como vários que pululam no país. O fato de Requião, hoje com 81 anos e que foi eleito pela primeira vez em 1983, estar agora no PT mostra a imensa dificuldade que o partido possui para produzir novos quadros e apresentar qualquer sinal de renovação. 

 

Uma novidade nesta eleição era o nome de Sérgio Moro. Mas a trajetória atabalhoada do ex-juiz e ex-ministro parece conduzi-lo a um desempenho eleitoral aquém do almejado. A falta de habilidade política do candidato é bastante aparente. O primeiro movimento foi tentar ser candidato à Presidência pelo Podemos, partido de todos os senadores do Paraná. Com a impossibilidade, tentou ser candidato à Presidência pelo União Brasil, partido recém-criado pela fusão do Partido Social Liberal (PSL, que elegeu Bolsonaro em 2018) e Democratas, se filiando em São Paulo. Destronado pelo presidente da legenda, Moro buscou uma cadeira para a Câmara dos Deputados, mas o Tribunal Superior Eleitoral recusou sua mudança de domicílio eleitoral. Moro, então, voltou sua atenção ao Paraná, restando-lhe apenas concorrer ao Senado para não ter que disputar votos com a candidatura de seu parceiro de Lava-jato, Deltan Dallagnol. O que o ex-juiz de Maringá não contava é com ter de fazer política e disputar com um senador experiente e com grande penetração no estado. Além disso, o União Brasil é controlado no estado por um grupo altamente bolsonarista. Não se vê apoio do próprio partido para um candidato que saiu do governo Bolsonaro de forma conflitiva. A falta de habilidade pode acabar jogando Moro para o limbo político. 

 

Ainda que muito do resultado eleitoral possa ser motivado pelas estratégias das elites políticas, como aponto acima, o contexto socioeconômico paranaense pode também dar pistas da estagnação política na qual nos encontramos. O estado é um celeiro nacional e internacional, líder na produção de grãos que figura nas posições superiores da pecuária. Ou seja, mesmo que não se encontrem apenas agricultores ou pecuaristas dentre seus habitantes, é essa matriz que movimenta a economia e define valores e o modo de ver o mundo da maioria da população. E, como se sabe, a postura menos arrojada e mais conservadora é típica de regiões que possuem base rural. Não só no Brasil, mas em qualquer lugar do mundo, um local dependente da terra para viver, tende a arriscar menos na política. No Paraná não é diferente. 

 

Bruno Bolognesi é cientista político, professor na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Coordena o Laboratório de Partidos e Sistemas Partidários (LAPeS). E-mail: [email protected]