Bruno de Castro Rubiatti

Publicado no Jota

Nessas eleições, o Senado foi renovado em um terço, isto é, cada estado e o Distrito Federal elegeu um representante para a câmara alta.  Em uma eleição onde os votos para presidente se dividiram basicamente entre dois candidatos e apenas eles foram os mais votados em cada estado, cabe indagar se a escolha para o Senado seguiu o mesmo padrão de votação dos candidatos ao Executivo Nacional, isto é, se houve uma nacionalização da disputa e os vencedores da disputa ao Senado correspondem ao vencedor da disputa presidencial em cada estado ou se fatores subnacionais tiveram maior impacto na escolha dos senadores.

Um primeiro ponto a se destacar é a distribuição partidária dos novos senadores: no total, nove partidos dividiram as 27 vagas em disputa. Como resultado, o PL conta com o maior número de senadores eleitos (oito ou 29,6% das vagas), seguido pelo União Brasil (cinco ou 18,5%) e PT (quatro ou 14,8%). Além desses partidos, o PP conquistou três cadeiras, Republicanos e PSD conquistaram duas cada e MDB, PSB e PSC ficaram com uma vaga cada. Como se pode notar, o resultado dessa eleição foi favorável aos partidos de direita, que conseguiram ampliar significativamente sua presença no Senado, muito às custas da presença dos partidos de centro.

Quando olhamos esses resultados por regiões, nota-se que o União Brasil teve seu melhor resultado para o Senado na região Norte: três dos seus cinco senadores eleitos foram nesta região. Já o PL conseguiu seus melhores resultados na região Sudeste (três) e Centro-Oeste (dois), isto é, cinco dos oito parlamentares eleitos pela legenda estão nessas regiões. Já o PT teve seu melhor resultado no Nordeste, tendo três dos seus quatro senadores eleitos pela região – a outra vaga conquistada pelo partido foi no Pará.

Todavia, no Brasil se permite a formação de coligações para a disputa de cargos majoritários, como são as eleições para os Executivos e para o Senado – único cargo legislativo a ter esse tipo de disputa. Assim, mais do que observar os partidos dos eleitos, cabe analisar a partir das coligações presidenciais e senatoriais.

Ao observarmos se o partido do senador eleito está na coligação do candidato à presidência mais votado no estado, temos em 16 estados essa correspondência. Em quatro estados do nordeste (Ceará, Maranhão, Pernambuco e Piauí) os senadores eleitos foram do PT e PSB, partidos que estão na coligação do presidenciável mais votado nesses estados (Lula, PT). Na região Norte, o mesmo ocorre no Pará, onde o senador eleito é do PT e o candidato à presidência mais votado no estado foi Lula (PT), e em Roraima e Rondônia, onde os senadores eleitos foram do PP e PL, ambos partidos que fazem parte da coligação de Jair Bolsonaro (PL), o candidato mais votado nesses estados. Os senadores eleitos na região Centro-Oeste eram todos de partidos da coligação presidencial de Jair Bolsonaro, candidato também vitorioso nesses estados. Nas regiões Sudeste e Sul, essa situação se repete, com exceção de Minas Gerais e Paraná, respectivamente.

Complementarmente, cabe apontar a direção oposta: se o partido do candidato à Presidência mais votado no estado faz parte da coligação do senador vencedor. Nesse caso, essa associação se dá em 17 estados. No Nordeste, em seis estados há essa associação: além dos quatro antes citados, entram Alagoas e Bahia, onde os senadores foram eleitos pelo MDB e PSD, que não fazem parte da coligação do presidenciável vencedor no estado (Lula, PT), mas o PT estava na coligação senatorial. Em três estados da região Norte há essa relação: no Pará, onde há correspondência do partido do presidenciável mais votado e do senador eleito (PT), em Rondônia, onde o mesmo ocorre, mas com o PL de Jair Bolsonaro, e no Amazonas, onde o senador eleito é do PSD, mas contou com o apoio do PT em sua aliança eleitoral. Já no Centro-Oeste, em três estados há essa relação (Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), mas não há no Distrito Federal, onde o PL (partido do presidente mais votado) lançou candidata própria ao Senado, que foi derrotada pela ex-ministra do governo Bolsonaro, Damares Alves (Republicanos) – lembrando que esse partido compõe a coligação eleitoral do próprio Bolsonaro. No Sul e no Sudeste se tem uma repetição da situação anteriormente apontada: apenas Minas Gerais e Paraná não apresentam essa relação.

Assim, em apenas oito estados não há uma relação entre os partidos do presidenciável mais votado e do senador eleito e suas respectivas coligações. Três desses estados estão na região norte: Acre, Amapá e Tocantins. Em todos eles, o senador eleito era do União Brasil e o candidato mais votado para a presidência foi Lula (PT) no Amapá e Tocantins, e Bolsonaro (PL), no Acre. Os partidos dos dois presidenciáveis apoiavam outros nomes ao Senado. Outros três casos estão no Nordeste: Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe. Em todos, Lula foi o mais votado para a Presidência, mas foram eleitos senadores do União Brasil, PL e PP, respectivamente, sendo que o PT estava na coligação de outros candidatos. No Sudeste, Minas Gerais é o caso em que não há uma vinculação partidária entre o eleito para o Senado e o presidenciável mais votado no estado: Lula (PT) foi o mais votado, mas o seu partido apoiava para o Senado Alexandre Silveira (PSD), que não foi eleito, sendo que a vitória foi de Cleitinho (PSC). Já no Sul, o caso do Paraná também não apresenta uma vinculação partidária: Sergio Moro (União Brasil) foi eleito e no estado Jair Bolsonaro foi o mais votado, mas o PL lançou o nome de Paulo Martins para o Senado. 

O resultado do primeiro turno das eleições de 2022 traz uma novidade para o Senado: o MDB deixa de ser a maior bancada da casa, perdendo esse posto para o PL. Junto com isso, o crescimento de outro partido de direita (União Brasil) dará ao Senado uma característica mais conservadora. Porém, cabe notar que a esquerda também apresentou um crescimento, mesmo que mais modesto. Assim, o grande perdedor na disputa para o Senado foi o próprio centro. Ao observarmos a vinculação dos partidos e coligações dos candidatos à Presidência com os partidos e coligações senatoriais vitoriosas, podemos ver que, na maior parte dos estados, há um vínculo entre eles, ou seja, os senadores eleitos esse ano são frutos dessa disputa para o Executivo nacional e, mesmo em casos onde não há uma vinculação partidária clara entre os resultados desses dois cargos, é possível que o posicionamento na disputa pelo Executivo nacional tenha impactado na escolha do Senador. Por exemplo, no caso do Paraná, mesmo sem vínculos partidários, é inegável que a eleição de Sergio Moro se vincula ao antipetismo e a atuação dele no governo Bolsonaro, que foi vitorioso no estado.

Por fim, é incontestável que questões estaduais também impactam na escolha para senador. Porém, nessas eleições o peso da disputa ao Executivo nacional parece ter se sobreposto na maioria dos estados.

 

Bruno de Castro Rubiatti é professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP) e da Faculdade de Ciências Sociais (FACS) da UFPA. Coordenador do Grupo de Pesquisa “Instituições Políticas: processo Legislativo e Controle”. Doutor em Ciência Política pela Unicamp e pós-doutorando junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFMG