Marta Mendes da Rocha, Luciana Santana e Gustavo Paravizo

 

Iniciadas a campanha eleitoral para escolha de novos governadores e governadoras e a realização de pesquisas de intenção de voto, já é possível ter uma ideia de em quais estados a disputa pode ser encerrada ainda no primeiro turno e onde ela está mais acirrada. Devido ao fato de as eleições estaduais e nacionais ocorrerem simultaneamente, a definição do resultado da eleição para governadores no primeiro turno pode ter importantes implicações para a corrida presidencial que, tudo indica, será decidida na segunda rodada.

 

Os eleitos e eleitas no primeiro turno poderão se dedicar integralmente à eleição de seu aliado na corrida presidencial. Isso pode ser particularmente importante nos grandes colégios eleitorais do país. Há também a possibilidade de que candidatos até agora reticentes em declararem apoio a Lula (PT) ou a Bolsonaro (PL), uma vez eleitos, sintam-se mais seguros para se posicionarem. Além disso, nos estados em que houver segundo turno é muito provável que a disputa para o governo estadual acabe reproduzindo de forma mais intensa a polarização nacional. 

 

Disputas estaduais com chance de decisão no primeiro turno

 

Considerando as sondagens de opinião, observa-se que em 13 unidades federativas há chances da disputa se encerrar no primeiro turno: Acre, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e Tocantins. Em onze deles os governadores tentam a reeleição. Analisamos a possibilidade de vitória no primeiro turno considerando a intenção de votos no candidato(a), com base nas pesquisas mais recentes do Ipec, divulgadas na segunda quinzena de agosto, e o quanto isso representaria em termos de votos válidos (excluindo-se brancos, nulos e indecisos). 

 

Os candidatos melhor posicionados para encerrarem o jogo ainda na primeira rodada são ACM Neto (UB), na Bahia, com 69% das intenções de voto e Renato Casagrande (PSB), no Espírito Santo, com 68%. Em seguida aparecem Mauro Mendes (UB) no Mato Grosso com 63% e Helder Barbalho (MDB) no Pará com 62% (este último, segundo pesquisa do Instituto RealTime Big Data de final de julho). Ronaldo Caiado (UB), Ratinho Jr. (PSD) e Fátima Bezerra (PT) aparecem com 60% das intenções em Goiás, Paraná e Rio Grande do Norte, respectivamente. Com intenções de voto entre 50% e 60%, também com chances de serem eleitos no primeiro turno, aparecem Romeu Zema (Novo), em Minas Gerais, com 58% das intenções de voto, Antônio Denarium (PP), em Roraima, e Wanderlei Barbosa, no Tocantins, ambos com 52%, e Silvio Mendes (UB) e Gladson Cameli (PP), ambos com 51%, no Piauí e no Acre, respectivamente.

 

Esse cenário sinaliza a possibilidade de que, ao final do primeiro turno, o União Brasil, partido criado em 2021 da fusão entre o DEM e o PSL, eleja quatro governadores. Também sinaliza maior tendência de continuidade na região Centro-Oeste, já que os atuais governadores podem se reeleger no primeiro turno em três dos quatro estados da região, a exceção sendo o Mato Grosso do Sul. Vale destacar, também, a vantagem do ex-prefeito de Salvador ACM Neto (UB) na Bahia e de Romeu Zema (Novo) em Minas Gerais, dois dos maiores colégios eleitorais do país.

 

Disputas estaduais com chance de decisão no segundo turno

 

Em outros 14 estados, as pesquisas sugerem que a disputa será decidida no segundo turno: Alagoas, Amapá, Amazonas, Ceará, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe. Em sete estados os atuais governadores lideram a corrida e devem chegar ao segundo turno em vantagem, segundo as últimas pesquisas do Ipec. Contudo, isso não significa que eles terão vida fácil no caminho para uma possível reeleição. 

 

Conforme apuramos, pelo menos cinco governadores eleitos em 2018 devem passar ao segundo turno se não com ampla dianteira, pelo menos com alguma folga (pelo menos 15 pontos de diferença em relação ao segundo colocado): João Azevedo (PSB), na Paraíba, com 40% das intenções de voto; Carlos Brandão (PSB), no Maranhão, com 39% dos votos válidos; Eduardo Leite (PSDB), no Rio Grande do Sul, com 43% (podendo se tornar o primeiro governador reeleito na história gaúcha). Também na liderança, mas com uma vantagem um pouco menor em relação ao segundo colocado aparecem o atual governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), com 40% dos votos válidos, e Carlos Moisés (Republicanos), em Santa Catarina, com 31%.

 

A disputa deve ser mais competitiva em pelo menos quatro estados. Em Rondônia, o atual governador Marcos Rocha (UB) e o senador e ex-governador Ivo Cassol (PP) estão empatados tecnicamente com 36% e 35% das intenções de voto, respectivamente. No Amazonas, o governador Wilson Lima (UB), e o ex-prefeito de Manaus e ex-governador, Amazonino Mendes (Cidadania), têm 35% dos votos válidos cada um. O cenário também é indefinido em Alagoas onde o governador Paulo Dantas (MDB) tem 30% e está tecnicamente empatado com Rodrigo Cunha (UB), com 27%. Apoios estratégicos têm deixado a competição política mais incerta no estado, sobretudo pelo endosso de Arthur Lira e Jair Bolsonaro às candidaturas desafiantes. 

 

Em outros sete estados, as eleições ocorrem sem a presença dos atuais governadores na corrida. Apesar disso, muitos deles trabalham para garantir a vitória de sucessores. Ao mesmo tempo, grupos locais se mobilizam diante da possibilidade de alternância na política estadual. No Amapá, por exemplo, Clécio Luís (SD) conta com o apoio do governador, Waldez Góes (PDT), e aparece com 49%. Ele é seguido de perto por Jaime Nunes (PSD), com 42%. No Mato Grosso do Sul, o ex-governador André Puccinelli (MDB) tem 31% dos votos válidos contra 20% do ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD) e 17,5% de Eduardo Riedel (PSDB), este último apoiado pelo governador, Reinaldo Azambuja.

 

Por fim, no Ceará, Capitão Wagner soma 40% e tem pequena vantagem sobre Roberto Cláudio (PDT), com 35%. Elmano de Freitas (PT), candidato respaldado pelo governador Camilo Santana (PT), depois de um atrito com o PDT de Ciro Gomes, é apenas o terceiro colocado.  Já em Sergipe, Valmir de Francisquinho (PL) – que depende de decisão do TSE para seguir candidato – tem 42% dos válidos contra 23% de Fábio Mitidieri (PSD), que conta com o apoio do governador Belivaldo Chagas (PSD). 

 

Entre os desafiantes que lideram as pesquisas, a situação mais confortável é a de Fernando Haddad (PT) em São Paulo, que registra 49% das intenções de voto e de Marília Arraes (SD), que abriu uma boa vantagem na última pesquisa e aparece agora com 42% dos votos válidos em Pernambuco. 

 

Impactos sobre a corrida presidencial

 

Ainda há muita coisa para acontecer até o dia 2 de outubro, mas se o cenário acima se confirmar, quais são as implicações para a corrida presidencial e um provável segundo turno entre Lula e Bolsonaro? Dos treze candidatos que podem se eleger ainda no primeiro turno, cinco contam com o apoio ou apoiam oficialmente Bolsonaro contra dois que apoiam Lula. Quatro optaram por não se alinhar abertamente ou não foram bem sucedidos na conquista do apoio dos presidenciáveis. Romeu Zema já deu indícios de que pode se alinhar a Bolsonaro em um eventual segundo turno, o que daria uma importante vantagem para o candidato do PL em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país. Os candidatos que lideram as pesquisas na Bahia, no Piauí e em Goiás já sinalizaram que pretendem permanecer neutros. Apenas no Pará, Lula se beneficiaria da vitória de Barbalho no primeiro turno. 

 

Nos estados com maiores chances de segundo turno, quatro das treze candidaturas que lideram as disputas para os governos estaduais estão alinhadas a Jair Bolsonaro já no primeiro turno, incluindo Claudio Castro no Rio de Janeiro, o terceiro maior colégio eleitoral do país. Em Santa Catarina, todos os candidatos competitivos oferecem palanque a Bolsonaro e em Rondônia, onde o presidente teve votações expressivas em 2018, há disputa judicial entre os candidatos pelo uso da imagem de Bolsonaro. Se os candidatos que lideram em Sergipe e no Ceará confirmarem sua presença no segundo turno, Bolsonaro ainda pode ganhar dois palanques fortes na região Nordeste. Uma situação peculiar é a de Clécio Luís (SD-AP) que recebe o apoio de Lula e Bolsonaro no Amapá.

 

Entre os candidatos que lideram nos estados onde a disputa está mais apertada e deve se decidir no segundo turno, cinco estão alinhados com Lula desde o início do período eleitoral, entre eles Fernando Haddad, em São Paulo, maior colégio eleitoral do país. Os outros quatro aliados de Lula lideram em estados do Nordeste onde o candidato do PT conta com importante vantagem em relação a Bolsonaro. 

 

Eduardo Leite (PSDB-RS) e André Puccinelli (MDB), que lideram a disputa em seus respectivos estados, até o momento não sinalizaram apoio para nenhum candidato em um segundo turno presidencial. 

 

Se o favoritismo dos atuais líderes nas pesquisas se confirmar, Bolsonaro pode garantir no segundo turno o apoio de governadores eleitos em seis estados, incluindo Minas e Rio de Janeiro, contra apenas dois de Lula. Nos cenários mais competitivos, Lula poderá contar com aliados fortes no Nordeste, região na qual ele tem melhor desempenho nas pesquisas. 

 

Marta Mendes da Rocha é professora associada do Departamento de Ciências Sociais da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), onde coordena o Nepol (Núcleo de Estudos sobre Política Local). É doutora em ciência política pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisadora do CNPq. Foi pesquisadora visitante na Universidade do Texas em Austin (EUA). Webpage: martamrocha.com

 

Luciana Santana é professora da UFAL (Universidade Federal de Alagoas) e da UFPI (Universidade Federal do Piauí). Mestre e doutora em ciência política pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), com período sanduíche na Universidade de Salamanca (Espanha). Líder do grupo de pesquisa Instituições, Comportamento político e Democracia e diretora da regional Nordeste da ABCP (Associação Brasileira de Ciência Política).

 

Gustavo Paravizo é jornalista, mestre e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora e pesquisador do Nepol (Núcleo de Estudos sobre Política Local).