Pagamento por anúncios eleitorais já somam mais de R$ 100 milhões

Pagamento por anúncios eleitorais já somam mais de R$ 100 milhões

Helena Martins e Rachel Callai Bragatto

Publicado na Carta Capital

A campanha começou no dia 16 de agosto e, com ela, também a corrida pela ampliação da presença das candidaturas nas redes sociais. Dada a lógica de funcionamento das plataformas digitais, que se baseiam em publicidade e têm reduzido o alcance orgânico das postagens, um dos caminhos para isso tem sido recorrer ao impulsionamento pago de conteúdos. Por meio desse mecanismo, os candidatos podem alcançar mais pessoas e, ao mesmo tempo, segmentar o público das mensagens, escolhendo perfis específicos e preparando materiais moldados de acordo com recortes sociais de idade, gênero, renda, localização e interesse. 

Ao todo, entre os dias 19 de agosto e 17 de setembro, anúncios associados às “questões sociais, política e eleições” somaram mais de R$ 76 milhões na Meta, corporação dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, e R$ 24 milhões no Google, detentora do buscador e também do YouTube. Os dados são da Biblioteca de Anúncios da Meta, que apresenta os valores aproximados de todos os candidatos e grupos que propagam informações políticas, e da página de transparência de anúncios políticos do Google.

O líder da disputa presidencial, Lula, também lidera os gastos em impulsionamentos. Foram mas de R$ 322 mil no Facebook e no Instagram e R$ 3,15 milhões em anúncios no Google, tanto de promoção de informações publicadas no site da campanha quanto de vídeos. A diferença mostra a estratégia de Lula de dar projeção a informações textuais que apresentem sua defesa e de criticar Jair Bolsonaro por meio de vídeos. Suas páginas no Facebook e no Instagram, em geral, apresentam imagens positivas da campanha eleitoral. Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro (PL) também apostam pesado nas empresas do Google. Investiram, respectivamente, R$ 2,05 milhões e 1,47 milhões.

O impulsionamento de conteúdos nas campanhas eleitorais opera em um terreno novo ainda pouco conhecido e regulamentado, dado que se trata de uma atividade permitida apenas nas últimas duas eleições. Ainda assim, a estratégia eleitoral vem tomando grandes proporções, tornando-se elemento importante para a obtenção de lucros pelas plataformas digitais. Por outro lado, cria uma situação de visibilidade condicionada pelo pagamento, o que pode desequilibrar a disputa eleitoral a favor daqueles que dispõem de mais recursos. 

É por meio do pagamento de anúncios que os contratantes podem segmentar o público para os quais apresentarão determinados posts, sendo que o funcionamento dessa segmentação, assim como a sua entrega, são regidos por algoritmos opacos, sobre se sabe e muito se fala. Isso diminui a transparência e pode facilitar a formação de filtros-bolhas ou câmaras de eco. Ou seja, grupos segmentados por interesses e visões de mundo comuns e expostos a conteúdo semelhante, nos quais os indivíduos só vão reforçando os seus próprios pontos de vista e se tornando refratários àqueles opostos. Muito tem se discutido a respeito do impacto disso na democracia, especialmente com relação aos seus efeitos sobre a polarização política em períodos eleitorais.

No caso do Google, mais de vinte mil anúncios foram espalhados na internet. Abaixo, a lista de maiores anunciantes, bem como os valores gastos por eles:

Já em relação às plataformas da Meta, a candidata à presidência da República Simone Tebet lidera o ranking de gastos, com um investimento de R$ 1.124.557, ao passo que dedicou R$ 644 mil para o Google. Ainda pouco conhecida do eleitorado nacional, a atual senadora tem impulsionado conteúdos de apresentação, com dados de pesquisas que mostram crescimento de intenções de votos e também mostrando-se como alternativa à polarização. 

Entre os candidatos à presidência, Ciro Gomes é o que aparece em segundo lugar no ranking do Facebook e Instagram, tendo empregado R$ 656.683 em anúncios. Volume superior foi destinado por Roberto Cláudio, candidato do PDT ao governo do Ceará: R$ 816.138. Logo atrás está Elmano de Freitas, do PT, que disputa com o pedetista o segundo lugar nas intenções de voto no estado. O petista empregou R$ 520.772 no primeiro mês da disputa eleitoral. Do mesmo estado, figura entre os dez maiores clientes da Meta o candidato a deputado federal pelo PV Célio Studart, com R$ 380.230. Assim como em 2020, os candidatos cearenses lideram entre os estados o gasto em impulsionamento na internet.

O candidato ao Senado em Minas Gerais Alexandre Silveira, do PSD, investiu R$ 424.975. Pleiteando o cargo de deputado federal, José Aníbal, do PSDB de São Paulo, dedicou mais de R$ 400 mil para anúncios nas redes da Meta.

Interessante notar que a campanha do presidente Jair Bolsonaro dedicou R$ 126.388. A conta utilizada para esses impulsionamentos foi a do Partido Liberal. A do próprio presidente não aparece entre os anunciantes. Assim, ao passo que outras páginas promovem o presidente e seu ideário, a do próprio adota uma estratégia baseada no engajamento da audiência. 

Nesse ecossistema, outros agentes que também valem-se de impulsionamentos importam. Além dos candidatos, as próprias empresas Facebook Brasil e WhatsApp Brasil aparecerem como anunciantes da categoria “questões sociais, eleições ou política”. Merece destaque também a produtora Brasil Paralelo, que empregou R$ 505.200. Interessante notar ainda a forte participação do “Ranking dos Políticos”, que gastou R$ 362.471 no último mês. Associada a um portal, apresenta-se como “uma iniciativa da sociedade civil que avalia senadores e deputados federais em exercício, classificando-os do melhor para o pior, de acordo com os critérios por eles estabelecidos, como combate aos privilégios, desperdício e corrupção no poder público”. A imensa maioria dos candidatos destacados na plataforma é de direita.

Até o pleito de 2016 no Brasil, os partidos poderiam utilizar a internet de forma orgânica. O impulsionamento em campanhas foi permitido na Minirreforma Eleitoral (Lei nº 13.488) de 2017, que incluiu entre os possíveis gastos eleitorais as formas de impulsionamento de conteúdo por meio da priorização paga de conteúdos em aplicações de busca na internet. Com a mudança ficou “vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes” (BRASIL, Lei nº 13.488/17, art. 57-C). O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por meio da Resolução nº TSE 23.610, liberou o impulsionamento de conteúdo na internet a partir da pré-campanha, vetando apenas o disparo em massa para um grande volume de usuários por meio de aplicativos de mensagem instantânea, como o WhatsApp. Na prática, tais medidas estimularam o pagamento para a obtenção de visibilidade, o que não ocorre no caso da TV e do rádio, em que os candidatos não podem pagar por anúncios. Na radiodifusão, o tempo de inserções é destinado ao Horário Eleitoral Gratuito e segue a proporcionalidade de representação dos partidos. Os custos para os candidatos e partidos são apenas com a produção do conteúdo e não com a sua veiculação e distribuição.

Em 2020, produzimos levantamento que mostrou que as 50 principais campanhas anunciantes gastaram, juntas, R$ 100 milhões. De 2018 para 2020, foi registrado um aumento superior a 40% no total repassado para tais empresas por meio de impulsionamento de conteúdos. Como os os próximos dias até 2 de outubro serão de fundamental importância para a disputa do eleitorado, é provável que a destinação de recursos para as corporações digitais siga aumentando. O quanto esse mecanismo afeta a isonomia entre as candidaturas, favorecendo a eleição de quem pagar mais, é um ponto que ainda carece de maior acompanhamento, debate e, possivelmente, regulamentação no Brasil. 

Helena Martins é professora da UFC. Doutora em Comunicação pela UnB, com sanduíche no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa (ISEG). É editora da Revista EPTIC. Coordenadora do Telas – Laboratório de Tecnologia e Políticas da Comunicação e integrante do Obscom / Cepos.

Rachel Callai Bragatto é jornalista, mestre e doutora em Sociologia pela UFPR. Foi visiting researcher na University of California – Los Angeles. Pesquisadora em estágio pós-doutoral no INCT/IDDC. Interessada em temas como democracia digital, participação política e cibercultura. 

Forças Armadas e desinformação

Forças Armadas e desinformação

A pesquisa “A cara da Democracia”, produzida pelo INCT IDDC na segunda quinzena de setembro, mostra que 54,3% dos brasileiros apoiam uma apuração paralela das eleições 2022 feita pelas Forças Armadas. Esse dado, que revela de imediato uma opção de parte da população por um arranjo de certa forma inédito na história democrática brasileira – a tutela das Forças Armadas em relação ao processo eleitoral – precisa ser analisado e bem observado também à luz do sistema de desinformação que se estrutura e se consolida com a ascensão do bolsonarismo. 

A desinformação sistemática e sistematizada do bolsonarismo e do governo Jair Bolsonaro tem produzido uma realidade paralela no país, o que sem dúvida provoca um estado de dúvida, insegurança e medo na população. O ecossistema de fake news tem, na tríade crenças + valores + medos, um componente potente que é trabalhado e bem utilizado. 

Portanto, esse apoio não é uma preferência pura e simples, é uma percepção construída meticulosamente utilizando esses “ingredientes” principais na produção dos discursos. Os eleitores brasileiros não acordaram, num belo dia, e pensaram: “Achamos interessante que as Forças Armadas façam uma apuração paralela da eleição”. Essa percepção, essa vontade, esse apoio, tudo isso foi cuidadosamente construído discursivamente e inoculado na população como vírus a partir da operação desse sistema de desinformação, com o bombardeio minuto a minuto de fake news, lives do presidente, declarações do presidente, notícias falsas nos portais fakes, ação de pastores nos cultos. Não é obra do acaso, tampouco uma percepção firme da população. 

Isso nunca esteve no âmbito da discussão das pessoas em relação às eleições no Brasil. Tal questão nunca esteve colocada, nunca foi minimamente considerada, nunca existiu, na verdade. Esse novo “atributo” das Forças Armadas no país foi uma construção – mais uma – da realidade paralela do sistema de desinformação bolsonarista. Nesse sentido, quero destacar aqui três aspectos importantes, em termos da produção discursiva, que me parecem muito relevantes para compreendermos esse cenário.

O primeiro deles se refere ao ataque sistemático às urnas. Desde 2018, com breves intervalos, Jair Bolsonaro ataca sistematicamente as urnas eletrônicas, o sistema eleitoral brasileiro, apontando fraude e ineficácia. No monitoramento que realizamos no âmbito da Editoria de Redes do Observatório das Eleições, o peso desses ataques é bastante evidente nas redes sociais – o termo “urna eletrônica”, no campo bolsonarista, tem sempre um aspecto pejorativo e de dúvidas sobre sua eficácia, o que gera bastante engajamento. Em suas lives, o presidente Jair Bolsonaro lança, reiteradamente, dúvidas sobre a eficácia das urnas, além de insinuar abertamente que qualquer resultado que não seja sua vitória será fraudulento. Esse discurso, meticulosamente produzido, tem uma capilaridade enorme, sendo disseminado pelas redes sociais, ganhando espaço em cultos e programas religiosos e até mesmo pautando a mídia tradicional – TVs, rádios e jornais passam a responder aos ataques do presidente sobre a eficácia das urnas. 

O outro aspecto é o medo da violência política, que tem ganhado espaço com os sucessivos casos envolvendo até mesmo o assassinato de opositores ao bolsonarismo. A partir desse medo que fica evidente na população – o chamado “voto envergonhado” é um indício importante desse estado –, o discurso relativo às Forças Armadas procura então mostrá-las como garantidoras de certa ordem e como instrumentos de força a coibir a violência ou a fraude. Portanto, esses discursos constroem uma percepção também positiva das FAs, o que pode levar à constatação, de parte da população, de que, se existe possibilidade de fraude, essa apuração paralela se justifica de alguma forma.   

Por fim, como terceiro aspecto, chamo atenção para a avalanche de produções mostrando resultados falsos de pesquisas falsas. Na última semana, circulou pelas redes sociais um suposto recorte de uma reportagem do Jornal Nacional dando o resultado de uma pesquisa Ipec com Jair Bolsonaro bem à frente de Lula. O vídeo é uma mostra do estrago que as deep fakes conseguem fazer. Em linhas bem gerais, esse recurso utiliza inteligência artificial para modular a voz e a expressão facial das pessoas, o que possibilita colocar em qualquer personagem qualquer tipo de discurso. O vídeo com a  suposta reportagem do JN impressiona pela qualidade – para um leigo, é impossível perceber que se trata de conteúdo fraudulento, mentiroso, inventado. Vale lembrar que um recurso com essa qualidade não é de baixo custo, ou seja, há ainda em operação um forte esquema de financiamento para produção e disseminação de fake news no Brasil. Esses conteúdos falsos aliam-se às declarações do presidente da República de que as pesquisas realizadas por institutos de reconhecida credibilidade – como Datafolha e Ipec – são mentirosas e que não reproduzem a realidade. Em contraposição, Bolsonaro cita reiteradamente o que ele chama de “datapovo”, ou seja, as pessoas nas ruas em apoio a ele. Pois bem, esse tipo de conteúdo e de declaração causa, sim, uma grande confusão para as pessoas que estão sendo bombardeadas com declarações oficiais – as declarações de pessoas públicas têm grande impacto na avaliação e  na construção da percepção das pessoas em relação aos fatos.

Esses três aspectos, coordenados, criam a percepção, na população, de que é positiva uma tutela das Forças Armadas nas eleições. Portanto, esse apoio à apuração paralela resulta também, sem dúvida nenhuma, desse poder de criação e disseminação de discursos e percepções do real que é fruto do complexo sistema de desinformação consolidado sob o bolsonarismo no Brasil. Na terra da realidade paralela, nada é aleatório.  

Análise: Bolsonarismo engajou nas redes com questionamento a integridade das urnas

Análise: Bolsonarismo engajou nas redes com questionamento a integridade das urnas

 

Editoria de Desinformação e Redes

Publicado no Boletim da Carta Capital

Na quarta semana de campanha eleitoral, o monitoramento da equipe de Redes do Observatório das Eleições, nosso relatório avaliou o efeito da cobertura dos atos em favor de Bolsonaro durante as celebrações do Bicentenário da Independência brasileira. Conforme esperado, as redes sociais monitoradas (Facebook e Instagram) demonstraram, ambas, dados favoráveis ao bolsonarismo.

Entretanto, os dados não foram tão positivos quanto os apoiadores do presidente esperavam. Tanto no Facebook, quanto no Instagram notamos que os números de interações, visualizações e seguidores aumentaram no grupo de páginas bolsonaristas, como esperávamos para uma semana com um evento tão importante. Todavia, os números foram inferiores aos da segunda semana de campanha, quando ocorreram as sabatinas dos candidatos à Presidência no Jornal Nacional, da TV Globo.

Narrativas na semana no Twitter

Na semana de 1 a 16 de setembro, a partir de um monitoramento considerando-se os temas mais relevantes no espectro do tema guarda-chuva “sistema eleitoral”, a partir dos tuítes com mais engajamento, foi possível identificar as narrativas que ganharam mais força, em cada campo, em relação às urnas eletrônicas:

Campo bolsonarista: ridicularizou a segurança das urnas eletrônicas e alegou a impossibilidade de se fazerem questionamentos sobre as urnas e o próprio sistema eleitoral (pois são perseguidos, segundo alegam). O campo bolsonarista também estabeleceu um paralelo distorcido do que ocorre na constituinte chilena com o debate sobre a integridade das urnas eletrônicas no Brasil.

Campo lulista: houve uma ridicularização da participação das Forças Armadas no debate sobre segurança das urnas eletrônicas e crítica à atenção dada a essa pauta pelo bolsonarismo diante da pauta da fome que atinge parte expressiva da população brasileira. Houve referência ao envolvimento do Exército nos testes de integridade das urnas no dia da eleição.

Esse material de análise foi produzido pela equipe da Editoria de Redes do Observatório das Eleições a partir do monitoramento de 400 contas, englobando atores diversos do campo Lulista e do campo Bolsonarista, em quatro plataformas: Twitter, Youtube, Facebook e Instagram. A Editoria de Redes Sociais do Observatório das Eleições visa produzir dados e análises sobre como as tecnologias digitais estão sendo utilizadas pelos atores nas eleições de 2022. A partir do monitoramento das plataformas, contribuímos para mostrar tendências e para avaliar o comportamento público de candidatos (as), militantes e apoiadores. Também lançamos luz sobre as políticas das empresas de Internet e sua relação com as autoridades eleitorais. Para mais informações e acesso a dados e análises, vejam a nossa página… e sigam as nossas redes.

Boletim Desinformação e Redes

Boletim Desinformação e Redes

Boletim de Redes e Desinformação

Publicado no Viomundo

O bolsonarismo usou e abusou da religião para fazer a mobilização para os atos de 7 de setembro. O monitoramento feito no Facebook identificou ao menos dois tipos de conteúdos que mais produziram interações em torno da data:

  1. Ênfase à importância da mobilização cívica da data para demonstrar a força social de Jair Bolsonaro e denunciar a teoria conspiratória de que ele é perseguido pela imprensa e pelo Poder Judiciário – STF e TSE.
  2. Uma interpretação do passado do país a partir do culto e da valorização da exploração colonial cristã portuguesa no Brasil

Esses dois motes estiveram presentes de maneira expressiva nos videos e textos convocando para o ato.

Sobre a importância da mobilização cívica, as publicações que se sobressaíram, em termos de engajamento, foram de contas de figuras políticas do bolsonarismo, com destaque para a deputada federal Carla Zambelli e o próprio Jair Bolsonaro.

A publicação de mais destaque da deputada, publicada em 6 de agosto, trata a mobilização como uma demonstração de força de Bolsonaro contra ministros do STF.

Em relação à ideia de uma valorização da colonização cristã, as publicações com maior engajamento foram de contas que já tinham um histórico de publicações dedicadas ao tema da religião

Engajamentos no Twitter

Lula postou menos, mas engajou 38% a mais por postagem no twitter na semana do 7 de setembro.

Bolsonaro aumentou o ritmo de publicações e teve crescimento de 8,5% de engajamento total – na reta final da campanha, isso deve se intensificar.

O post mais bem-sucedido de Bolsonaro foi o que ele critica Lula por tê-lo comparado ao movimento extremista Ku Klux Klan, com um total de 121.695 interações.

Em relação a Lula, a postagem dele ressaltando o reencontro com Marina Silva para discutir propostas para o meio ambiente teve uma boa repercussão, gerando gerou 106 mil interações.

No WhatsApp, bolsonaristas aproveitam 7 de setembro para engajar, mas viralização é baixa

No WhatsApp, bolsonaristas aproveitam 7 de setembro para engajar, mas viralização é baixa

José Maria Monteiro e Helena Martins*

Publicado no Ninjas

Mensagens de convocação, ameaças e auto elogios foram propagadas em grupos de WhatsApp associados à direita, entre os dias 6 e 8 de setembro. Levantamento feito pelo Farol Digital, parceiro do Observatório das Eleições, analisou 231 grupos e verificou que houve atividade em 171, conformando uma amostra de 23.448 mensagens e 2.674 usuários. O feriado do 7 de setembro foi mencionado em 93 deles, portando em 40% do total monitorado. Nestes, houve 683 mensagens sobre o 7 de setembro, envolvendo 245 usuários. O alto número de grupos com atividade sobre a data indica que ela mobilizou a base bolsonarista, mas não permite afirmar ter havido uma grande mobilização virtual.

Em meio aos 171 grupos ativos no período, a mensagem mais compartilhada tratou do discurso do presidente Jair Bolsonaro em Copacabana, chamando os destinatários para assistirem o ato. “Bolsonaro discursa em Copacabana lotada no 7 de setembro em um dos cenários mais lindos do país. Festa do Bicentenário da Independência termina à altura da grandeza do Brasil”. Criado pelo site direitaonline.com.br, o conteúdo foi visto em 12 dos grupos monitorados. Também em 12 grupos circulou a mensagem: “Em vídeo de campanha, Presidente Bolsonaro convida brasileiros para celebração de 7 de setembro”, do mesmo portal.

Outras mensagens também repercutiram em mais de dez grupos. Uma apresentava o vídeo do discurso do presidente em Copacabana. Outra chamava para o desfile das tropas em Manaus, publicado pela campanha de um apoiador de Bolsonaro que é candidato a deputado estadual no Amazonas. Vale notar que, em todos os monitoramentos realizados pelo Farol nestas eleições, foi expressiva a presença de mensagens bolsonaristas no Amazonas.

Várias outras mensagens relacionadas ao 7 de setembro circularam em mais de 5 grupos. Além do já mencionado Direita Online, outro site ganhou destaque na amostra, o Pensando Direita. Deste site, uma mensagem com grande circulação tratou de decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE): “📌TSE nega pedido do partido de Ciro Gomes para investigar se campanha de Bolsonaro”, legitimando o ato e, simultaneamente, desgastando o candidato Ciro Gomes. A ação foi movida pelo PDT e, de fato, rejeitada pelo Tribunal.

A maior parte das mensagens contém mídia (68,88%), ao passo que a presença de mensagens essencialmente textuais diminuiu (31,12%). Os estados com maior número de mensagens são São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará, Bahia, Santa Catarina e Pará. Já os usuários mais ativos estão em Rondônia, Paraíba, Alagoas, Distrito Federal, São Paulo, Minas Gerais, Roraima, Mato Grosso e Espírito Santo. Como no caso das mensagens mais compartilhadas, vale notar a presença de estados da região Norte, o que indica forte atividade de bolsonaristas por meio do WhatsApp naquele local. Em alguns casos, os mais ativos registram o dobro da média de postagem dos usuários em geral:

 

O usuário que mais postou espalhou conteúdos 39 vezes. O conteúdo era um texto do site Pensando Direita, em tom crítico ao que teria sido, por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), uma ação de limitação ao 7 de setembro. O mesmo texto foi replicado por outros usuários em dezenas de grupos. Em verdade, o que o STF fez foi ampliar a segurança dos prédios da instituição, a fim de evitar a aproximação de caminhões, como ocorreu em 2021. A repetição mostra que o STF segue sendo um alvo preferencial dos discursos bolsonaristas.

Desinformação à vista

Quando observadas as mensagens relacionadas ao 7 de setembro, notamos a presença de conteúdos com tom convocatório, apresentação de pautas e informações sobre o ato em Brasília. Conteúdos desinformativos também foram verificados, como é o caso de mensagem que foi vista em quatro grupos que trata de suposta tentativa de impugnação da chapa de Bolsonaro à presidência: “BOMBA EM BRASÍLIA: O TRIO QUER IMPUGNAR A CHAPA DE BOLSONARO. Numa pesquisa INTERNA, NÃO FALSA, o PT descobriu que Lula SÓ TEM 17% dos votos e que BOLSONARO GANHA no primeiro turno COM 62% dos votos. ROUBAR na apuração está DIFÍCIL, porque as FFAA ESTÃO em cima. Só RESTA dois caminhos pra BANDIDAGEM: MATAR Bolsonaro ou IMPUGNAR a chapa. Matar Bolsonaro (que tem apoio popular inquestionável) OCASIONARIA uma revolta popular com CONSEQUÊNCIAS imprevisíveis. PARECE só restar IMPEDIR Bolsonaro concorrer. Se a bandidagem CHEGAR a tanto, a REVOLTA POPULAR será DEVASTADORA para o STF e Congresso. NINGUÉM VAI segurar. O TRIO (pressionado por Lula, Zé Dirceu e PCC) não tem limites. Os próximos dias SERÃO TENEBROSOS. O DESESPERO da esquerdalha é total. Eles SABEM que NAS URNAS eles serão FRAGOROSAMENTE derrotados. Mas Bolsonaro não pode se reeleger, na VISÃO DELES.Será o FIM do BLOCO COMUNISTA da América LATINA …POVO NAS RUAS DIA 7 DE SETEMBRO EM MASSA !!!Será a NOSSA decisão de NÃO sermos a próxima Argentina, Venezuela, Cuba, etc … O FUTURO dos nossos filhos e famílias ESTÁ NAS NOSSAS MÃOS !!! COMPARTILHE”.

A mensagem reúne argumentos constantemente usados por apoiadores de Bolsonaro, como suspeição em relação às eleições; associação de petistas, inclusive Lula, à associação criminosa PCC; alardes sobre o risco do comunismo, com uso de casos de países latino-americanos para tratar do que seria o caminho do Brasil, caso Bolsonaro não vença. Segundo estudo do projeto Eleições Sem Fake, da UFMG, nos últimos três meses, essa foi a mensagem mais compartilhada nos 569 grupos políticos de todo o país monitorados pelo projeto, o que mostra que esse tipo de conteúdo vinha sendo difundido de forma coordenada.

Do mapeamento do grupo Farol, merece destaque também um texto, intitulado “Carta ao presidente do Brasil”, em que é apresentado um ultimato: “Desde 2018, estamos brigando com parentes, amigos, vizinhos, brigando em redes sociais, para tentar mudar esse país, para tentar deixar um país melhor para as outras gerações. Hoje, escutei do senhor Presidente que, dia 7 de setembro, será o último aviso, será a última oportunidade de colocar o país nos eixos. Então, Presidente, quero lhe perguntar: será, mesmo, a última manifestação? Se não houver mudança, no dia 7 de setembro e não vier uma resposta do líder que elegemos com quase 70 milhões de votos, EU DESISTO”. O texto é associado ao jornalista Alexandre Garcia, mas não consta fonte oficial que confirme tal autoria.

Há ainda um texto, apresentado como “mensagem espiritual”, com forte tom religioso, pedindo que “Aqueles que não forem às ruas deverão permanecer em oração em apoio às forças do bem”. No dia seguinte, conteúdos exaltando a dimensão das manifestações também foram compartilhados nos grupos monitorados, mas nenhuma em mais de 12 grupos. Já o link mais compartilhado foi visto 35 vezes. Trata-se do link para o grupo Direita Online no Telegram, que possui mais de 5200 usuários.

O número de compartilhamentos da mesma mensagem por parte de um usuário tem aumentado em relação ao que verificamos nas semanas anteriores, mas, apesar das repetições, não é possível afirmar que a viralização das mensagens se dê por meio de mecanismos automatizados. O usuário mais ativo espalhou a mesma mensagem 12 vezes, algo exequível para um humano. Outros três usuários espalharam o mesmo conteúdo 11 vezes.

Abaixo, uma nuvem de palavras apresenta as que mais foram repetidas nos textos:

 

 

Nas semanas anteriores, a palavra mais recorrente foi Lula. A análise dos dias em torno do 7 de setembro mostra que, com os atos na data comemorativa, o bolsonarismo conseguiu engajar sua base e disputar o rumo da conversação sobre as eleições. À primeira vista, o intuito foi alcançado, mas o número de grupos com movimentação e de mensagens comuns indica que a capacidade de viralização e coordenação das atividades não é a mesma de 2018. A mesma conclusão foi apresentada, neste Observatório, a partir da análise comparativa das mensagens sobre o 7 de setembro no Facebook, nos anos de 2021 e 2022. O uso das redes segue sendo um trunfo importante de Bolsonaro, mas também nesses espaços parece que a “novidade” desbotou.

 

*José Maria Monteiro é professor de Computação da Universidade Federal do Ceará, coordenador do Farol Digital.

Helena Martins é professora da UFC. Doutora em Comunicação pela UnB, com sanduíche no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa (ISEG). É editora da Revista EPTIC. Coordenadora do Telas – Laboratório de Tecnologia e Políticas da Comunicação e integrante do Obscom / Cepos.

Bolsonarismo e uso da fé na semana do bicentenário

Bolsonarismo e uso da fé na semana do bicentenário

Alexandre Arns Gonzales e Amanda Barcelos Mota *

Publicado no Brasil de Fato

A religião foi um instrumento de mobilização do bolsonarismo para o 7 de setembro de 2022. O monitoramento do Facebook foi realizado pela equipe do Observatório das Eleições e identificou ao menos dois tipos de conteúdos que mais produziram interações em torno da data.

Um enfatiza a importância da mobilização cívica da data para demonstrar a força social de Jair Bolsonaro e denunciar a teoria conspiratória de que ele é perseguido pela imprensa e pelo Poder Judiciário – STF e TSE. O outro interpreta o passado do país a partir do culto e da valorização da exploração colonial cristã portuguesa no Brasil.
Sobre a importância da mobilização cívica, as publicações que se sobressaíram, em termos de engajamento, foram de contas de figuras políticas do bolsonarismo, com destaque para a deputada federal Carla Zambelli e o próprio Jair Bolsonaro. Essas contas compartilharam vídeos de crianças de colégios públicos cantando o hino da independência e marchando ao som de banda militar. A página de Jair M. Bolsonaro se destacou com uma publicação, no dia 30 de agosto, trazendo uma mensagem breve dizendo que a data é “de todos os brasileiros” e serve para “relembrar nossa independência e renovar nossa luta pela liberdade!”.

A publicação de mais destaque da deputada Carla Zambelli foi publicada no dia 6 de agosto e trata a data de mobilização como uma demonstração de força de Bolsonaro contra ministros do STF. A conta publicou um vídeo da própria deputada em entrevista para algum podcast, em que afirma que a mobilização servirá para “mostrar pro mundo que a imprensa tá mentindo, que as pesquisas estão mentindo”.

Sobre a valorização da colonização cristã, as publicações com maior engajamento foram de contas que já tinham um histórico de publicações dedicadas ao tema da religião. Convém salientar que, embora essas contas tenham realizado chamados para participação no 7 de setembro, as taxas de engajamento das convocatórias foram menores do que as de seus conteúdos tradicionais. O histórico de publicações dessas contas contempla temas, assuntos e questões como reprodução de trechos de discursos de pastores durante cultos, defesa da heteronormatividade, supostos relatos pessoas que se converteram à fé cristã ou convites para realização de uma determinada oração “contra inveja”.

Contudo, em algumas das publicações religiosas em que não há explicitamente convocação para a data da independência, há um enlace entre a religiosidade e o aspecto político. Essas publicações são vídeos de apresentações de músicas gospel com participação da Michelle Bolsonaro ou uma música carregada de elementos de valorização patriótica.

Por fim, o tipo de conteúdo que se sobressaiu na véspera do 7 de setembro e que, de modo mais acabado, sintetiza a instrumentalização da religião para disputa política dos sentidos e significados da data foi a divulgação do vídeo da ex-atriz Cássia Kiss, por meio dos canais do Centro Dom Bosco, e que foi replicado por outras páginas.

No vídeo, ela diz que o “Brasil foi uma terra povoada por católicos portugueses e fundado à sombra de uma santa missa tradicional” e complementa que “graças aos nossos antepassados, nos tornamos um país católico de dimensões continentais”. O discurso valoriza a ascendência europeia católica, decorrente da exploração colonial, invisibilizando a existência anterior dos povos indígenas no território, bem como da migração forçada, por meio da escravidão dos povos africanos.

O vídeo é um chamamento para a vigília, que se realizou às 4 horas da manhã do dia 7 de setembro, carregado de mensagens para reafirmar a narrativa, ou seja, os discursos mencionados acima. No chat ao vivo do Youtube, comentários dos fiéis deixavam em evidência os temas que estão bastante presentes na narrativa bolsonarista: contra o comunismo, pela liberdade, contra os “inimigos da pátria” e mesmo pedindo a vitória de Jair Bolsonaro.

Entre os comentários de destaque, houve um, pago (Super Chat) pela candidata Carla Zambelli, sintetizando o discurso da maioria dos comentários dos que acompanhavam a transmissão: “Orando pelo Brasil, pelo Presidente, por nossa LIBERDADE e pela saúde de todos os brasileiros”.

Esse discurso encontra guarida e reforço na política oficial do governo federal para celebração do bicentenário da independência política do Brasil.

Nesse contexto, trazer o coração embalsamado de Dom Pedro I para marcar a celebração consiste, além do menosprezo das lutas populares que consolidam a história do país, a valorização das estruturas oriundas da exploração colonial como elemento virtuoso na formação das condições atuais de exercício de soberania do país. Assim, nas palavras do Ministro de Relações Exteriores do Brasil, Carlos Alberto França, Dom Pedro I é retratado como uma pessoa de “genuíno altruísmo” e alçado à figura de “nosso libertador”.

O monitoramento no Facebook

As contas do Facebook foram monitoradas por meio da ferramenta CrowdTangle, no período de 1º de julho a 1º de setembro, a partir da busca pelo termo “7 de setembro”. Foram coletadas 23.835 publicações. Desse material, foram selecionadas as 10 contas com maiores taxas de engajamento: Césio Salvaro, Elisa Robson, Samir Ahmad, Daniel Santos, Carla Zambelli, Luciano Hang, Prefeitura de Criciúma, Bolsonaro Presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro.

Tendo sido identificado o uso religioso nesse universo de publicações, aplicamos então o filtro para selecionar as 10 com maiores taxas de engajamento usando os termos “cristão”, “cristã” e “cristianismo”, e encontramos as seguintes: Sou católico e sou feliz, Aleteia português, Papa Francisco – Amigos e Amigas, Centro Dom Bosco, Jornal da Cidade Online, Jovem Pan News e Jovens Católicos.

Entre os dias 1 e 7 de setembro, as páginas no Facebook que realizaram publicações chamando para participação do 7 de setembro religioso, embora tenham obtido expressivo engajamento em suas convocatórias, tiveram maiores engajamentos em outras publicações, aquelas que não estavam ligadas ao evento, mas mantinham o cunho religioso e a devoção.

Convém salientar que essas páginas têm em seu histórico de publicações com engajamento a reprodução de trechos de discursos de pastores, durante cultos, tratando de alguma passagem da Bíblia ou o convite à realização de alguma oração. Elas desempenham, em termos de engajamento, mais interações do que aquelas voltadas à mobilização do dia 7 de setembro religioso, mas têm uma conexão moral, por compartilharem os mesmos valores.

Dessa forma, como já dissemos, se estabelece uma ligação entre a religiosidade e o posicionamento político, deixando subentendido como os fiéis devem votar ou mesmo participar de eventos de importância ao apoio do atual presidente, candidato à reeleição, por este defender “Deus, Pátria e Família”.